Refletindo sobre a minha área de formação universitária, a Educação Física, gostaria de compartilhar um trecho de uma entrevista, com Marcos Neira (especialista da Universidade de São Paulo), concedida à Revista Nova Escola.
Achei muito interessante suas colocações e fiquei refletindo sobre muitos aspectos que devemos analisar no cotidiano de nossas escolas. Tarefa nada fácil, principalmente para quem pensa que dar aula de Educação Física é "barbada".
Segue o trecho da entrevista:
Qual é o objetivo da Educação Física escolar hoje?
NEIRA É
o mesmo objetivo da escola: colaborar na formação das pessoas para que
elas possam ler criticamente a sociedade e participar dela atuando para
melhorá-la. Dentro dessa missão, cada disciplina estuda e aprofunda uma
pequena parcela da cultura. O que a Educação Física analisa é o chamado
patrimônio corporal. Nosso papel é investigar como os grupos sociais se
expressam pelos movimentos, criando esportes, jogos, lutas, ginásticas,
brincadeiras e danças, entender as condições que inspiraram essas
criações e experimentá-las, refletindo sobre quais alternativas e
alterações são necessárias para vivenciá-las no espaço escolar.
Como deve ser uma aula ideal?
NEIRA Certamente
não deve ser a do tipo "desce para a quadra, corre, corre, corre, sua,
sua, sua e volta para a sala". A Educação Física proposta na escola não
pode ser a mesma proposta em outros espaços. Se é apenas para o aluno se
divertir, existem lugares para isso - ginásios públicos e centros
comunitários, por exemplo. Se é somente para aprender modalidades
esportivas, melhor procurar um clube ou uma academia. A escola não serve
para formar atletas, mas para refletir e entender as manifestações
culturais que envolvem o movimento.
Um exemplo concreto: como abordar o futebol nessa perspectiva?
NEIRA O
trabalho pode começar com a turma experimentando jogar futebol, mas não
pode parar por aí. A vivência de qualquer modalidade na escola exige
reflexão e adaptação. Propondo uma pesquisa, é possível levar os alunos a
conhecer outros tipos de futebol - de campo, de quadra, de areia,
feminino -, conhecer quem pratica o esporte hoje, como se jogou no
passado e como se pode jogar na escola. É importante que eles saibam,
por exemplo, que o esporte já foi praticado sem juiz, que os atletas não
tinham números na camisa e que o pênalti era cobrado de outra maneira.
Com base nessas informações, voltam à prática já atentos a novas
questões: é preciso arbitrar os jogos? Como fazer meninos e meninas
participar simultaneamente? E as crianças com deficiência?
Apesar de a disciplina ter se tornado mais reflexiva, as atividades práticas continuam sendo importantes?
NEIRA É
claro. A vivência segue sendo fundamental porque é somente por meio
dela que a turma sente a necessidade de fazer adaptações, algo presente
em todas as modalidades. Afinal, elas se transformam conforme
"conversam" com a sociedade. O voleibol, por exemplo, mudou seu sistema
de pontuação principalmente para se adaptar às transmissões de TV. Essa
lógica vale para todas as manifestações corporais, mesmo as mais
lúdicas. Quando alguém brinca de pega-pega na rua, brinca de certo
jeito. Quando vai brincar com 35 crianças na escola, precisa adaptar a
atividade para que ela funcione.
Campeonatos e festivais esportivos continuam tendo espaço?
NEIRA
Particularmente, acho que montar uma seleção com seis a 12 alunos e
deixar 300 sem aula para disputar uma competição é fabricar adversários.
Não podemos partir do pressuposto de que um pequeno grupo vai ser
privilegiado e participar da atividade enquanto a maioria vai apenas
torcer, ou nem isso. Agora, se os educadores consideram a competição
algo importante, é possível, sim, organizar eventos, mas de uma
perspectiva diferente. Sugiro, por exemplo, combinar de levar uma turma
de 5ª série para jogar com a de uma escola próxima, negociar regras,
fazer todo mundo participar da experiência e realizar uma avaliação
conjunta depois, discutindo o que os jovens acharam da atividade e como
melhorá-la numa próxima vez.
Um comentário:
Muito bom! Não sou da área, mas gostei da reflexão.
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